Caríssimos irmãos, dai graças ao Senhor porque Ele é bom, porque eterna é a sua misericórdia.
Is 54,8: “Em um momento de cólera escondi de ti o meu rosto, mas logo me compadeci de ti, levado por um amor eterno”. Este versículo nos mostra que a cólera do Senhor dura apenas um instante, Ele é lento na ira, enquanto a sua misericórdia dura eternamente.
Encontrei uma partilha de um superior carmelita no Egito e quis hoje compartilhar com vocês trechos dessa experiência com a misericórdia, vivenciada “na escola do Papa Francisco”.
Disse ele: em minha vida existem três fases bem claras:
A primeira fase, que eu chamaria da “lei pela lei”, onde eu dizia a mim mesmo e também aos outros: para que existem as leis? Para serem observadas, então devemos saber observá-las e não interpretá-las. Quem erra pague pelos seus erros. Uma fase terrível onde o coração era de pedra, duro, mais com os outros do que comigo, mesmo porque sempre há duas leis: uma para os irmãos e uma para os amigos, e quem sabe uma terceira para si mesmo.
A segunda fase da minha vida foi quando comecei a compreender uma palavra do Evangelho: “Bem aventurados os misericordiosos porque encontrarão misericórdia”. Essas palavras de Jesus me escandalizaram bastante, mas comecei a entender, dentro desta dinâmica, que é necessário descer do pedestal do próprio orgulho e da própria “impecabilidade”. Descobri isso quando comecei a cometer pecados e a sentir sobre os meus ombros a dureza e incompreensão dos confessores, dos professores, dos mestres de Israel. Vi que só sentindo o olhar benigno de Deus sobre mim mesmo, pecador, podia recomeçar o caminho. E como sacerdote e confessor, decidi então nunca usar a mão da lei, mas sim o coração da misericórdia. E deu certo. Levantar-me dos meus erros e com Teresa D’ Ávila dizer “cantarei as misericórdias do Senhor”.
A terceira fase é aquela que estou vivendo. Compreendi a misericórdia quando comecei a meditar “que Deus não quer sacrifícios, mas misericórdia” e me ajudou Teresa do Menino Jesus e a grande Oração ao Amor Misericordioso de Deus onde a pequena Teresa se oferece vítima não à justiça de Deus, mas à misericórdia de Deus. É a fase mais bela da vida. Por que condenar? Por que deixar pesar sobre os ombros dos outros o próprio peso da condenação quando Jesus deu todo o seu sangue para nos perdoar. O melhor caminho para a conversão não é condenar o outro, mas abraça-lo no amor e abrir as portas do coração e da casa como fez o pai para o filho pródigo que voltava depois de ter gasto tudo em coisas estúpidas da vida. Ser misericordioso quer dizer: posso estar errado e se alguém quer atirar as pedras sejam elas bem vindas e por misericórdia não vou devolvê-las. Significa reconhecer o erro, o pecado, mas dizer sempre para o pecador “coragem, está perdoado, vá em frente”.
Aliás, o evangelista João em sua carta, sintetiza a misericórdia com palavras que deveriam ser gravadas sobre todos os confessionários, não neste Ano da Misericórdia, mas sempre: “se em alguma coisa o teu coração te condena, recorda que o coração de Deus é maior do que o teu”. Somente assim podemos sentir o olhar de Deus que penetra no mais profundo de nós mesmos. Mas não nos condena, estende as suas mãos para nos chamar, para nos abraçar e para nos doar o seu amor.
Irmãos é preciso descobrir e experimentar Aquele que é a misericórdia. Não por acaso Jesus teve que ser duro com Pedro, quando este, negou-se a deixá-lo lavar os seus pés. Disse Jesus: “Se eu não te lavar, não terás parte comigo (…) dei-vos o exemplo para que, como eu vos fiz, também vós o façais”.
Nesta semana, vivenciando a misericórdia do Senhor, vamos olhar e perceber como Deus tem agido com misericórdia para comigo, nas pequenas ou grandes coisas do dia-a-dia, nas orações, cantos, trabalhos, no estudo e no silêncio. Não deixar passar sem que eu perceba sua presença misericordiosa. Ter a certeza que Deus me procura, nunca para me condenar, mas para me salvar.
Ao mesmo tempo, que a experiência da misericórdia de Deus não me torne desmazelado com o cuidado espiritual pelo excesso de confiança, mas ajude-me, justamente por conhecer, buscar com mais veemência a conversão pessoal e de que não é verdade aquele pensamento que diz que, ninguém pode dar o que não recebeu; a verdade é que ninguém pode dar o que não tem, pois à luz da liberdade humana, “a pessoa pode dar o que não recebeu”; mesmo que não tenha sido tratada com amor ou sinceridade, ela pode decidir amar e ser sincera; mesmo que não tenha encontrado mãos estendidas para se segurar quando caiu, ela pode decidir sempre estender a sua a quem precisar.
É possível, também na vida, fazer uma limonada com os limões que a vida oferece. Deus é misericordioso, mesmo quando não merecemos e nem por isso deixa de sê-lo. É na circunstancia da vida, no nosso caso, hoje, na convivência do seminário que cada um é chamado a confrontar e a decidir. Ser misericordioso é uma decisão pessoal. A quem o deseja, Deus dá a graça.
Pe Dilmo Franco de Campos