Permitam-me uma vez mais deter a nossa reflexão sobre a misericórdia no acontecimento do evangelho do domingo, Lc 15,11-32. Quero ressaltar dois pontos de reflexão:
• O Pai, ao escutar o pedido do filho mais novo, não o impede de ir embora; tempos depois quando quis voltar, não o impede de entrar. Notemos que quando ele está saindo, o pai não o acompanha, não o incentiva, mas quando está voltando, o Pai vai ao seu encontro, acolhe, abraça, faz festa. O Pai sempre tem a porta do seu coração aberto para nós. Uma porta de duplo acesso: sair e entrar. Saímos quando queremos e podemos entrar quando queiramos também. Quanta liberdade o Pai nos dá.
• Outro ponto intrigante é que, apesar do filho ter vivido todos esses anos ao lado de um Pai tão misericordioso, ele não tenha aprendido a misericórdia. Não aprendeu nada com o Pai. Foi impiedoso. O matou em vida. É o sentimento de tantos pais católicos fervorosos, que têm os seus filhos mergulhados no mundo e por serem da Igreja, sofrem por isso. O pai também sofreu. E chegam a achar que tudo o que fizeram foi perdido. O Pai nos dá o testemunho de que não o foi. Pois, quando o filho quis voltar, ele sabia para onde voltar e ele tinha para onde voltar. A lembrança da casa do Pai e a certeza de quem era o Pai o faz voltar. É importante na nossa caminhada sabermos viver e aprender com o Pai. Pode ser que os caminhos da vida nos levem, ora para um lugar, ora para outro, mas o importante é sabermos para “onde” voltar e “ter” para onde voltar. Se o filho não conhecesse esse Pai, ele não saberia para onde voltar e nem teria para onde voltar.
Num romance, mesclado de fato e ficção, “Quando Nietzsche chorou” de Irvin D. Yalom, ele fala de um sentimento suicida de Nietzsche e que Josef Breuer, futuro pai da Psicanálise, o apresenta a um jovem chamado Sigmund Freud. E entre tantas conversas com Freud, Nietzsche revela, que apesar de ter uma espírito viajante necessário para as suas descobertas, tem uma tristeza de não ter ao certo para onde ir e voltar e demonstra uma pequena “inveja” se é que posso dizer assim, do amigo Freud, que tem uma casa, uma esposa e uma família. Imediatamente Freud lhe faz a proposta para que ele fique morando com eles, que eles o amam, e que se ficar terão todo o tempo para conversarem sobre as idéias e pensamentos que tanto lhe apeteciam e poderia cuidar melhor da sua saúde. Nietzsche pensa por dias e ao final agradece, dizendo que, não poderia abrir mão do seu espírito viajante, pois era a sua essência, mas que o simples fato dele saber que tinha, a partir de agora, um lugar para voltar, já tirava toda angústia do seu coração. Sentimento de ser amado.
Irmãos, a porta está sempre aberta, para sairmos e voltarmos. Muito mais importante do que o lugar de onde estamos, temos um lugar para onde voltar e o modo como vivo onde estou agora, está dizendo se estou saíndo ou voltado para Ele.
Por Pe Dilmo Franco de Campos