“Não só de pão vive o homem, mas de toda palavra que sai da boca
de Deus” (Mt 4, 4)
A cada ano a Igreja nos oferece a quaresma, um tempo para uma maior intimidade com o Senhor, para progredir no seu conhecimento, procurando responder ao seu amor por uma vida santa. Tempo propício para se intensificar a luta, o combate espiritual contra as tentações do mal, que tantas vezes quer nos fazer opositores de Deus e do seu projeto de
salvação.
Pela natureza humana somos herdeiros de Adão, mas pela graça somos herdeiros de Jesus Cristo. Qual dos dois queremos servir? A Adão ou a Cristo? Se somos entregues às nossas vontades somos servidores de Adão. Mas se somos entregues à vontade de Deus somos alter Chistus. Aquele que enfrenta o tentador no deserto da vida e o vence por sua obediência e fidelidade a Deus.
Adão está sujeito à lei do pecado que conduz à morte, mas Jesus Cristo nos comunica a graça que nos devolve a vida e nos dá a salvação. Porém, sem combate, sem renúncia, não é possível permanecer na graça de Deus. Assim, a caridade, o jejum e a oração constituem o tripé que nos ajuda a manter-se na graça de Deus.
A caridade nos coloca em íntima comunhão com o Senhor e com o próximo, bem como nos ajuda a tomar consciência da nossa real dignidade de seres incondicionalmente amados por Deus. De modo, que as duas maiores expressões de caridade é a adoração somente a Deus e o zelo desinteressado pelo bem próximo.
O jejum forma e fortalece a nossa vontade para dizer um sim decidido somente àquilo que vem de Deus. Uma vontade que encontra sua alegria em viver na lei do Senhor, em seguir seus caminhos, seus mandamentos, e nutrir-se com sua palavra. O jejum dos alimentos visa formar a vontade para abster-se das obras más, da injustiça, do roubo, do engando, da mentira, do adultério, da fornicação, da difamação.
A oração é a via própria daqueles que permanentemente e em todas as circunstâncias dialogam com o Senhor. Com a nossa oração podemos adorá-Lo, glorifica-Lo, agradecê-Lo. Podemos dar ação de graças, podemos pedir, podemos interceder. Quando não se tem vida de oração, o homem cessa seu diálogo com o Senhor, já não mais O escuta. Termina por fechar-se num monólogo consigo mesmo ou com o tentador. À exemplo de Eva, a humanidade, que dialoga com a serpente e sucumbe diante da sua tentação. Porque permitiu que a serpente semeasse em seu coração a desconfiança em relação às promessas de Deus.
A mesma tentação apresentada a Eva pela serpente, simbolizada pelo comer, é a mesma que o tentador apresenta a Jesus, convidando-O a transformar as pedras em pão para matar a sua fome. Eva cai na tentação porque desconfiou da veracidade de Deus que havia lhes recomendado não comer o fruto da árvore: “Mas do fruto da árvore que está no meio do jardim, Deus nos disse: ‘não comais dele nem sequer o toqueis, do contrário morrereis’” (Gn 2, 3).
Jesus pelo contrário tem total confiança no Pai, tanto que diz: “Meu alimento é fazer a vontade daquele que me enviou e consumar a sua obra” (Jo 4 34). Aquele que se alimenta de fazer a vontade do Pai, não se deixa seduzir pela mentira do tentador. Mesmo em meio as dificuldades. Na sua tentação Jesus nos ensina que é possível ser fiel a Deus até nas horas mais difíceis, assolado pela fome, pela violência, pela fraqueza, pelo medo, pela
ambição. Optar sempre por Deus.
Por fim, a nossa vitória sobre o pecado e a morte passa por nossa total confiança no Senhor, nas suas promessas. Porque somente aquele que nos concedeu o dom da vida, pode nos conceder também o dom da salvação. Nas dificuldades, nos sofrimentos, nas fragilidades e pecados, qualquer oferta de salvação, por mais tentadora que seja, se não vem de Deus, por Jesus Cristo é falsa. Qualquer solução que não vem de Deus é enganosa. À exemplo das soluções momentâneas que o tentador oferece a Jesus. Que neste tempo quaresmal possamos fugir das soluções fáceis e das propostas baratas de salvação. Renovemos nossa adesão incondicional a Deus, o único no qual podemos encontrar graça e salvação.
Pe. Hélio Cordeiro dos Santos
Formador do seminário maior N. S. de Fátima
Brasília – DF
Leituras: Gn 2,7-9;3,1-7 / Sl 50 (51) / Rm 5, 12-19
Evangelho: Mt 4, 1-11