“Eu sou a ressurreição e a vida” (Jo 11,25)
A liturgia deste domingo nos indica que há no ser humano uma constante luta entre a vida e a morte. Se pela graça carregamos o Espírito de Cristo, que é Espírito de vida e salvação. Por outro, carregamos um corpo ferido de morte em consequência do pecado (cf. Rm 8, 10). Porém, o desejo de Deus a nosso respeito é o de nos comunicar a vida. Por isso, ao ressuscitar seu amigo Lázaro, Jesus prefigura a sua ressurreição ao mesmo tempo que se revela como aquele que tem poder também sobre a morte. Esta luta de Jesus Cristo contra a morte chega ao seu desfecho final na cruz, na qual a morte é definitivamente vencida.
Nestas últimas semanas a morte deixou de ser um futuro distante para a humanidade como um todo. Mostrando-se como uma ameaça presente, real. Se de um lado a morte é esta presença ameaçadora, do outro, em Jesus Cristo temos uma promessa de vida e salvação: “Eu sou a ressurreição e a vida. Quem crê em mim, mesmo que morra viverá” (Jo 11, 25). Se pelo pecado carregamos a morte em nosso corpo, pela graça carregamos a vida eterna.
Que este tempo, no qual a morte se mostra uma ameaça tão próxima, possamos intensificar nossa fé na vida que não passa, na ressurreição. Que nos disponhamos a viver este tempo de precariedade com esperança, com simplicidade, fazendo tudo o que está ao nosso alcance, o que é recomendado pelas autoridades sanitárias, para minimizar a expansão do vírus. Bem como procurando viver a fraternidade, sobretudo para com os mais necessitados. Zelando pela vida uns dos outros.
Que este tempo nos ajude a matar a ambição, o individualismo, a incredulidade, o egoísmo, o consumismo, a violência, a injustiça, a indiferença. E nos faça redescobrir o valor do bem comum. Se na bonança estamos sujeitos a perder a consciência da fraternidade entre os homens, na penúria, isto não pode se esconder, porque nos toca a todos.
Este tempo nos ajuda a tomar consciência de algumas verdades outrora esquecidas ou adormecidas por um estilo de vida superficial. À saber: a humanidade é frágil e vulnerável; a morte não é um futuro assim tão distante; a ciência não tem todas as respostas; a normalidade da vida é um valor considerável, ao qual nem sempre damos o devido valor; existem valores mais absolutos do que a economia; redescobrir o valor do bem comum, através do mal comum (Covid–19); o homem precisa de Deus, mediante uma autêntica experiência de fé.
Esta vida é uma peregrinação, não temos aqui morada definitiva. Mas não é uma peregrinação sem sentido. O peregrino poderia chegar até o destino da sua peregrinação por muitos meios que não caminhando, mas isto não seria peregrinar. Pois a peregrinação se faz caminhando. É no caminho que o peregrino se encontra, para no fim encontrar-se mais inteiro, mais aberto para acolher a Deus.
É no caminho que o peregrino vai se esvaziando de suas ilusões, das coisas e apegos desnecessários. Quanto mais longo o caminho menos carregado de si e de coisas vai se tornando o peregrino. À medida que se desfaz das exterioridades o peregrino alarga o seu interior, para fazer-se morada do Espírito.
O peregrino é aquele que decidiu não mais viver a sua vida, mas a vida Daquele que nele habita: “se o Espírito daquele que ressuscitou Jesus dentre os mortos mora em vós, então aquele que ressuscitou Jesus Cristo dentre os mortos vivificará também vossos corpos mortais por meio do seu Espírito que mora em vós” (Rm 8, 11). No mistério de Jesus Cristo depois da morte segue a ressurreição. Que depois deste tempo de morte possamos todos ressuscitar para uma vida mais autêntica, mais humana, mais fraterna, mais voltada para Deus e para o próximo, do que para nós mesmos e para os bens passageiros deste mundo.
Por fim, o Espírito que habita em nós não somente assume a nossa vida, mas assume também a nossa morte, para que Jesus Cristo “ressurreição e vida”, nos ressuscite no último dia. Se nosso corpo está ferido de morte pelo pecado, pela graça carregamos também a vida que não passa.
Pe. Hélio Cordeiro dos Santos
Formador do seminário maior N. S. de Fátima
Brasília – DF
Leituras: Ez 37,12-14 / Sl 129 (130) / Rm 8,8-11
Evangelho: Jo 11,1-45