“Jesus estava rezando…” (Lc 11, 1)
O início do evangelho de hoje nos fornece uma informação no mínimo inquietante: “Jesus estava rezando” (Lc 11, 1). Sendo filho de Deus, verdadeiro Deus e verdadeiro homem, completamente despojado de qualquer interesse mundano; qual seria o conteúdo da sua oração? Certamente, a oração de petição não ocupava o primeiro lugar. Também não faz sentido pensar que Jesus apresentasse suas necessidades materiais em sua oração.
Mas Jesus rezava. E sua oração não era egoísta, porque Ele não se colocava no centro dos seus pedidos diante do Pai. Se procuramos no evangelho uma luz quanto ao conteúdo da oração de Jesus, constatamos que no centro da mesma estava o seu desejo de glorificar o Pai e a intercessão pelos seus, pela humanidade, pela salvação do mundo.
Na sua oração sacerdotal, no capítulo 17 do Evangelho de São João, há uma amostra significativa da oração de Jesus. Na qual Ele glorifica o Pai (Jo 17, 1.4); também intercede pelos seus: “Eu rogo por eles. Não te rogo pelo mundo, mas por aqueles que me deste, porque são teus…Pai Santo, guarda-os em teu nome, nome que me deste, para que eles sejam um, como nós somos um” (Jo 17, 9-11).
Dado o conteúdo da oração de Jesus, é possível ver que não se trata de uma oração autor referencial, egoísta, mas é uma oração essencialmente de comunhão com o Pai e com a humanidade. Por isso, seu modo de rezar é o modelo para a nossa oração. Sobretudo neste tempo, no qual a oração tem se reduzido a uma mera expressão egoísta, que coloca no centro a pessoa que reza e suas necessidades. Não Deus, não o outro. Uma forma de orar fechada e reducionista, que não contempla a centralidade de Jesus Cristo nem a abertura para os outros. Não que não possamos apresentar a Deus nossas necessidades, muito pelo contrário, até devemos, como Jesus mesmo nos ensina a pedir: “Dá-nos a cada dia o pão de que precisamos…”.
Porém, não podemos nos esquecer de glorificar a Deus com nossa oração, nem deixar de pedir pelas necessidades dos nossos irmãos, da Igreja, da humanidade. Não podemos permitir que nossa oração se torne uma realidade fechada sobre o nosso próprio mundo, sobre nossos próprios problemas, para que não se transforme num lamento do eu. Porque a oração é a expressão mais alta do nós, daqueles que vivem em comunhão com Deus e com seus irmãos.
A oração autêntica contempla sempre o nós, próprio dos que pertencem à família de Deus – a Igreja. Por isso Ele nos ensina a rezar “Pai nosso…” não meu Pai. Para não perdermos a consciência que não é possível estar em comunhão com Deus, quando se ignora a comunhão com os irmãos.
Se vem a nos faltar a vigilância corremos o risco de começar a tratar a Deus como tratamos as coisas passageiras deste mundo, minha casa, meu carro, minha fazenda, meu dinheiro, meu Deus. De modo egoísta, como se Deus fosse um servo que estivesse a nosso serviço como se costuma fazer egoisticamente com as coisas que nos pertencem. Não! Definitivamente, Deus não pode ser monopolizado, Ele é “Pai nosso”, ou nosso Pai como afirma Jesus: “Mas vai dizer aos meus irmãos: subo para junto do meu Pai e vosso Pai, meu Deus e vosso Deus” (Jo 20, 17).
Deus é Pai, dos ricos e dos pobres, das crianças e dos anciãos, dos brancos e dos negros, dos sadios e dos enfermos, do letrado e do iletrado, dos consolados e dos desesperados. Ele é nosso Deus, nosso Pai. Cada vez que nos dirigimos assim a Ele estamos nos reconhecendo como membros de sua família, de sua Igreja. Fugindo da tentação egoísta de reduzir-Lo a um objeto privado e particular, que está de plantão para atender as minhas necessidades. O que se torna um jogo de manipulação, no qual o homem tenta manipular Deus. Quando lembramos demais de nós em nossa oração acabamos nos esquecendo de Deus e dos outros.