Na simplicidade da sua oração o publicano nos ensina que oração autêntica começa com o reconhecimento da soberania de Deus sobre nós
Quem confia na justiça de Deus não se fia na sua própria justiça, foge de qualquer experiência de julgamento ou de autosuficiência. Porque espera na justiça que vem de Deus. Confiar na própria justiça leva a dois caminhos perigosos: a presunção e o se fazer juiz dos outros. Este foi o desvio grave da oração do fariseu, e constitui o desvio grave na vida de oração de muitos crentes, que ao se considerarem justos e santos, se acham no direito de julgar os outros e desprezar a graça de Deus.
A sua oração não estava direcionada para Deus, mas para si mesmo. O fariseu confia de tal modo na sua justiça ao ponto de pensar que não precisa da justiça de Deus. A sua presunção o impede de reconhecer o agir de Deus na sua vida, chegando à conclusão que a sua suposta bondade é fruto somente do seu esforço pessoal. Postura muito próxima da de muitos homens que se vangloriam da sua justiça, ao mesmo tempo que desprezam a Deus e se fazem juízes dos outros.
Na vida e na oração do fariseu, embora, como ele próprio afirma, não houvesse pecados graves: roubo, desonestidade, adultérios, ademais cumpria com seus deveres religiosos; porém não havia espaço para Deus, ele se considera o autor da sua própria virtude, da sua própria bondade. Sua oração não é para a glória de Deus, mas para o enaltecimento de si mesmo. É o típico homem que se considera tão virtuoso, ao ponto de considerar que não precisa da religião, da fé, de Jesus Cristo. Sua vida gira entorno do seu próprio umbigo, enquanto despreza a Deus e acusa o próximo.
O fariseu vive uma espécie de ateísmo religioso, ou seja, pratica a religião, mas seu coração ainda não aderiu a Deus, sua confiança está em si mesmo. Ou ainda, aquele que aderiu a uma vida virtuosa, mas não tem humildade para aderir a Jesus Cristo. Ou aquele que aderiu a Jesus Cristo, mas não se preocupa de levar uma vida virtuosa. Como muitos que pensam que a fé cristã consiste apenas na vivência de um conjunto de virtudes. Se esquecendo que a aventura da fé começa com a adesão a uma Pessoa – Jesus Cristo – autor da nossa salvação.
O fariseu se esqueceu que a oração é para a glória de Deus e não para glorificar a si mesmo. Ele faz todo o contrário na sua oração: glorifica a si mesmo e ainda acusa e despreza os outros. Se esqueceu que a conversão autêntica só se realiza quando reconhecemos a ação de Deus em nós e assumimos a condição de pecadores; quando nos tornamos capazes de glorificar a Deus e acusar diante Dele os nossos pecados. Se acusássemos os próprios pecados diante de Deus com a mesma convicção e violência com a qual acusamos os pecados dos outros, daríamos largos passos de conversão.
Neste sentido o publicano é um modelo de crente, não se apresenta como homem virtuoso, no entanto, é capaz de reconhecer-se necessitado da misericórdia de Deus e de confessar a sua condição de pecador: “Meu Deus, tem piedade de mim, que sou pecador!” (Lc 18, 13). Aquele que não se considerava virtuoso tinha valiosas virtudes: a humildade, a virtude da religião, a transparência, a fé, o realismo.
Na simplicidade da sua oração o publicano nos ensina que oração autêntica começa com o reconhecimento da soberania de Deus sobre nós ao dizer “Meu Deus”. Em segundo, a abertura de coração para acolher o perdão, a misericórdia, a piedade que lhe é oferecida por Deus. Em terceiro lugar, a visão realista de si mesmo: “sou pecador!”. Condição indispensável para se mergulhar na santidade e na graça de Deus. Enquanto o ser humano não for capaz de dizer Meu Deus, tem piedade de mim, sou pecador, continuará na sua egolatria, no culto do eu, da sua própria virtude. Como tantos homens e mulheres soberbos que se vangloriam da sua virtude à despeito da graça de Deus e da religião. Que quando abrem à boca não é para glorificar a Deus, mas para glorificar a si mesmo e suas obras.
Este tipo de homem farisaico é muito comum em nossos dias. Homens que se consideram tão justos e virtuosos que acham no direito de se fazerem justiceiros. Submetendo a juízo a Deus e os outros. Estes normalmente desconfiam de tudo, menos da sua pretensa justiça. Se esquecendo de algo essencial, nenhuma justiça humana é capaz de salvá-lo. Porque a única justiça que salva é aquela quem vem Deus, manifestada na cruz por Nosso Senhor Jesus Cristo. Nesta justiça podemos confiar.