Vocação à vida

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Caros amigos, Deus em sua obra criadora dá o ser e a vida a tudo o que existe; forma o homem e a mulher à sua imagem e semelhança, fazendo-os sinais visíveis e instrumentos eficazes de sua gratuidade e liberdade.

Nas primeiras páginas da Sagradas Escrituras lemos que Deus chama o homem à vida quando lhe inspira nas narinas o sopro da existência (cf. Gn 2,7). Este chamado é perpetuado mediante a cooperação livre e responsável dos esposos no gravíssimo dever de transmissão da vida humana (cf. Humanae vitae, 1). Por meio do dom da fecundidade, o homem participa do poder criador e da paternidade divina (cf. Catecismo da Igreja Católica, 2367).

Toda a obra criadora manifesta o amor de Deus, e de modo mais pleno a vida que é dada ao homem, assim como a vocação a uma participação no seu próprio ser. É no seio da família, de onde emana a vida, que encontramos o reflexo deste amor criador (cf. Gratissimam Sane, 2).

Deus nos conhece antes mesmo de sermos concebidos no seio materno, antes de nosso nascimento nos consagrou e deu-nos uma missão (cf. Jr 1,5). É verdade que não pedimos para nascer, mas todos os dias somos impulsionados a uma resposta livre ao chamado amoroso de Deus. A vida é nossa primeira vocação!

A Igreja crê e ensina que a vida humana, mesmo se débil e com sofrimento, é sempre um esplêndido dom da Criação. Contra o pessimismo e o egoísmo que obscurecem o mundo, a Igreja está do lado da vida: e em cada ser humano sabe descobrir o esplendor do Sim do próprio Cristo (cf. Familiaris Consortio, 30).

Contudo, vivemos um contexto social e cultural que torna cada dia mais difícil essa compreensão. O progresso técnico-científico gera uma angústia profunda quanto ao futuro e um fechamento no estreito horizonte da dimensão biológica da vida. Estes dois caminhos confluem para a construção de um homem que se torna senhor da vida e da morte, incapaz de captar o caráter transcendente do seu existir como ser humano. “A vida torna-se simplesmente ‘uma coisa’, que ele reivindica como sua exclusiva propriedade, que pode plenamente dominar e manipular” (Evangelium vitae, 22).

O Papa Francisco denuncia que a difundida mentalidade do útil, da cultura do descarte, que escraviza os corações e as inteligências, reduz as relações interpessoais ao interesse de troca e exige a eliminação de seres humanos que não contribuem com a produtividade individual ou social (cf. Discurso aos ginecologistas católicos).

A esta contemporânea mentalidade diabólica contrapõe-se a verdade Evangélica – “eu vim para que tenham vida, e a tenham em abundância” (Jo 10,10) – que reconhece na vida humana a dimensão transcendente, o sinal da obra criadora de Deus.

Num mundo onde se fabricam cada vez mais armas e leis que atentam contra a vida, é urgente o nosso SIM decidido e sem hesitações em sua defesa, desde a concepção até a morte natural.

Dom Edney Gouvêa Mattoso

Bispo de Nova Friburgo (RJ)